sexta-feira, 26 de março de 2010

Lechuga. Vem lá de dentro do coração

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Está ela no pequeno espaço da Galeria Mariana Moura. Lá no canto da sala, ofuscada por telas maiores e mais coloridas. Está lá, humilde e singelamente, aguardando a atenção de visitantes mais observadores, menos grandiosos, mais simples. Lechuga, ao contrário de outras peças encontradas no ateliê, localizado em Boa Viagem, não pretende chamar a atenção de ninguém. Suas cores e suas formas clamam pelo que é mais prosaico na vida cotidiana do ser humano contemporâneo: o seu lar.

A obra de Marina Rheingantz é grandiosa pelo que possui de simples. Em óleo sobre tela, tamanho 33 X 42 cm, vê-se um trabalho diminuto, no entanto capaz de abarcar uma infinidade de sentidos, tal qual um fragmento de memória em captação. Ao representar, em Lechuga, objetos que soam familiares ao homem, como cama, vento e flores, Marina obtém o sucesso de dar continuidade à formação identitária de suas produções, reconhecidas pelos tons rebaixados e pelas tentativas de representação dos lugares e objetos construídos pela memória humana.

Bucolicamente, Lechuga atinge o que está adormecido dentro do coração: a vontade de intimidade. Por viver em um universo cada vez mais concreto e impessoal, o homem se desliga, muitas vezes, da unidade de sua existência. Assim Lechuga, um quadro despretensioso, descoberto por uma despretensiosa visita, mostra que a existência do homem, no entanto, abarca sentidos múltiplos e únicos. O que não é, de fato, algo despretensioso.

Mamam reabre as portas com diversidade

Submarino Submerso - Maurício Castro
Foto: Divulgação / Flávio Lamenha

Após dois anos em reforma, o Museu de Arte Moderna Aluísio Magalhães (Mamam) reabre suas portas. E só as do andar térreo. Devido a processos burocráticos, o primeiro e o segundo andar do prédio ainda não possuem climatização, e o elevador ainda não foi instalado. Entretanto, já se vê em funcionamento o Aquário Oiticica – inaugurado com a revisão dos Parangolés do artista plástico Hélio Oiticica – e um salão, onde está a mostra “contidonãocontido”.


Em sintonia com o processo de reforma do museu, a mostra, que durará seis meses, pretende realizar uma renovação conceitual do acervo do Mamam. Computador, papel e impressora estão à disposição do público para que este possa sugerir a inclusão, no acervo, de expoentes das artes plásticas pernambucana. Simultaneamente, mais informações podem ser adicionadas nas pastas dos artistas já catalogados. A mostra renova também o conceito de museu: o público agora é ativo na escolha das obras a serem expostas.


Também na “contidonãocontido”, estão à vista artes totalmente divergentes entre si, como a de Gilvan Samico e a de Maurício Castro. O objetivo de unir nanquim e escultura em um só salão é mostrar a heterogeneidade da arte pernambucana, incitando o público a enriquecer o acervo do museu com diversidades.

Já o Aquário Oiticica, localizado na entrada do museu pela Rua da União, é inaugurado com a mostra HO/REC, sobre a vinda de Hélio Oiticica para o Recife, em 1978, e a realização da performance Parangolés. O aquário estará destinado a experimentos artísticos.

A previsão é a de que o Mamam inaugure o segundo e o terceiro andares a partir do segundo semestre.


Mamam: Rua da Aurora, 265, bairro da Boa Vista, Recife. Funcionamento de terça a sábado, das 10h às 19h; e aos domingos, das 10h às 17h. Informações: (81) 3232.1694/ 2188.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Coisas sobre o amor


O AMOR
só acontece uma vez, assim como a morte. É fatal, não pede licenças e nos põe à vista uma escuridão total. O que vem pela frente? Amar é morrer e, pior, morrer todos os dias, porque a gente precisa se reinventar, procurar exceções no senso comum, ser um pouco otimista quando a regra é o negativismo e vice-versa, para tornar o relacionamento, símbolo maior do amor em existência, prazeroso. Quem ama sabe as estripulias que têm de ser feitas para ter, ao lado, o ser amado, e este, por sua vez, precisa saber personificar a criatividade e sabedoria.

O amor não é imediato, a paixão, sim, e passível de multiplicação. O amor é uno, não se submete a regras matemáticas, não se soma, não se subtrai, não se multiplica, não se divide. O amor demora e só floresce a depender do clima, do tipo de cultivo e das mãos do jardineiro, principalmente. Quando ele se instala, a escuridão é total, porque a fluidez do que existia antes, a independência do "ir ali e voltar", o "estou aqui, mas amanhã posso não estar", a leveza de tudo se acaba, e o amor finca as suas garras na carne do ser amado. Possuir, cercar, proteger faz parte do amor, são elementos bonitos de sua natureza, mas que podem, no entanto, transformarem-se em uma faca de dois gumes. Pincelar sucessivas camadas de traços meus no quadro do ser que amo vai tirá-lo as cores próprias, as cores que me encantaram e, então, o amor mata o próprio amor. Amar é tirar dos talheres de casa todas as facas de dois gumes que possam vir a existir.

Amar é bom e não é. É companhia e opressão, é ódio, é presença e distância, é aquela eterna neblina do outro lado da ponte. Não tem como dizer que amar é difícil, porque o "dar-se" que o amor provoca simplesmente é. É entregar-se ao outro. O difícil é saber lidar com as peculiaridades do ser amado, entender que não existe uma "fusão", não existe um "dois em um" - existe o dois em dois, pois não há meio de dissipar o eterno mistério que o outro abarca. Difícil são as divergências.

Amar é árduo. É um trabalho. Um exercício. Mas, antes de tudo, é saber se entregar ao destino, como um barco de papel está entregue às ondas do mar. Ele sabe que, um dia, alcançará uma terra de belezas insondáveis, onde os outros barquinhos nunca vão atracar, pois preferiram, medrosamente, não atravessar o horizonte de mares sem fins.

Te amo!