quinta-feira, 15 de abril de 2010

um poente

escuta três tiros.

e continua na sua atividade habitual: às quatro horas, sol se pondo, vai à padaria, comprar o pão nosso de cada dia. quentinho, saído da fornalha. pão macio pra morder, um afago, um conforto depois de um dia meio atabalhoado. leva o saco habitualmente. e escuta três tiros. recife é assim, cidade violenta, a tendência é piorar mesmo.

abre o portão da casa antiga, uma herança. pensa no pão com manteiga, café pra acompanhar. vai à cozinha. olha o corredor.

a vermelhidão se espelha, se contorce o peito vermelho do filho amado, antes branco, agora vermelho. um vermelho meio amarelado, misturado – não se sabe se com o amarelo da manteiga ou o plasma. corredor estreito. lá no meio, um corpo estirado. irreconhecível seu filho.

que fazer? que dizer? como unir o sentimento macio do pão com o ferro do sangue? sangue de filho?

recife é assim, cidade violenta, a tendência é piorar mesmo. é o amarelo da manteiga e o vermelho do sangue que se misturam, em um tão doloroso poente.




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Algo realmente doloroso aconteceu esta semana. Pra quem pretende “experimentar” coisas novas, pensem duas, três, dez vezes. Crack não é mole, não “abre a cabeça”, nem leva ninguém pra frente. Cuidem-se.
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