terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Uiui 2008.


Pois é, né...? Mais um ano passou e eu resolvi abrir um post pra falar sobre alguma coisa que ainda não sei. Fazer retrospectiva às vezes é um pouco depressivo, porque você vai vendo os momentos bons e ruins, e somando as dores com as felicidades. Se der em um zero a zero você fica se sentindo uma pessoa uó, tipo em matemática: sinal positivo + sinal negativo cancela e fica nada. Meu deus. Chega de depressão! 1. Chega porque nunca fica nada, sempre fica um monte de experiências especiais, lembradas principalmente por cheiros. Eu mesma tenho um perfume de pitanga da Natura que me lembra a época 'mombojete' da minha vida, um hairspray que me lembra a festa de Laís, que acabou na piscina depois das biritas, a porra de um hidratante da Dove bronzeador que a pele fica toda manchada, mas me lembra umas invenções minhas que eu tive de sempre dançar antes de dormir, e eu me melava todinha desse hidratante. Eita queimação do carai. Mas tá, né. Continuando... Eu tinha essa mania ¬¬'. E tem também um desodorante da Dove antitranspirante sem cheiro, que não me lembra nada. :]

2. De depressão porque eu nunca tive esse carai, então deixar de drama, plis.

Falando sério, esse final de ano foi complexo demais pra minha cabecinha. Too much information, ok? Eu na verdade queria uma sessão de acupuntura dessas que meu pai tá fazendo no ombro depois de ter quebrado a clavícula (ele tá melhor, gente) nesse final de ano. NESSE FINAL DE ANO. Eu acho que é o carma, sério mesmo. Acho que papai do céu viu que o ano foi muito bom e resolveu colocar mais números negativos pra soma ser 0. Se bem que ele até que me deu uns pontinhos positivos que estão descontando alguns momentos insuportáveis desse dezembro tenebroso, né...? Internas, gente. O blog não é mais amigo meu do que Júlia não, então não vou me abrir desse jeito, sabe? Não que eu me abra de algum jeito especial pra Júlia. Ah, tá bom. Parou! Vocês me entenderam.

Daqui a poucos dias a gente vai ver de novo um monte de fogos coloridos no céu. Bem coloridos! Prenunciando um ano colorido, com pessoas coloridas e beijos coloridos e saúde colorida e tudo bem feliz. E colorido. Vai ser ótimo! A gente vai tirar umas notas baixas, outras altas, vai brigar com professor que só o carai ainda, e brigar com nós mesmos, e passar por crises existenciais de "ninguém me ama" ou então "eu não amo ninguém". Vamos chorar de rir, chorar de verdade, ficar com dor de barriga, dor de cabeça, comer mooooooito na Páscoa, perder umas caloriazinhas no Carnaval, ter um novo amor, perder um amor novo, ou então preservar o amor tornando-o não velho, mas maduro. A gente vai fazer o inferno com nossos pais e depois dar neles um monte de beijinhos. Vamos fazer amigos novos e nos afastar de alguns e beber vinho e desistir da cerveja porque dá bucho. A gente vai conhecer uma banda massa, e vamos colocar umas fotos dela no Orkut (será que vai surgir algo mais viciante que o Orkut em 2008?), jurando que é a melhor banda de todos os tempos. Nós vamos pra alguma festa do caraleo que vai marcar o ano. E vamos nos arrepender de ter feito algo, certeza. Mas tudo bem diante de tudo isso, a gente tem que é viver mesmo, intensamente, pra depois que a gravidade atingir os nossos corpos não ficarmos arrependidos de não ter vivido, o que é pior de ter se arrependido de viver. Desejo a todos vocês um ano bem-vivido, com muita sede para apreensão de conhecimentos, porque só isso que a gente leva da vida, ok? Bjs bjs e se cuidem, meus blues babies.



Obs. Sim... Talvez vocês não entenderam essa foto riponga no post dedicado ao ano de 2008, mas é que quando eu acabei de escrever comecei a escutar In my life dos Beatles, e achei que nada melhor do que fazer uma homenagem a jovens que foram capazes de lutar pelos seus ideais. Vivendo de forma intensa e morrendo cedo. Acho que a vida não é mensurada pela quantidade de dias vividos, mas pela forma como foram vividos. É isso aí.



"Amar e mudar as coisas me interessa mais" - Belchior

domingo, 23 de dezembro de 2007

Falsas Imponências


Aparente, externa,
completa e fortemente
construímos um fortal.
Umas demonstrações de inabaláveis sentimentos,
Uma cara dura.

Mas...

Um passo em falso
Meio-passo torto
Duas palavras-facas
Uma mudança em cheio causa desespero.
Fechaduras sem molde
Palavras-chaves sem molde
Pensamentos disformes
Sentimentos contidos e inexpressivos.
Uma fatalidade,
que é além do explicável,
é fatal às agendas e planos,
aos amores e laços.
Torna-se atordoante,
Enlouquecedor e sádico
Um fato fora do filme idealizado.

Nas nossas imponências construímos um retiro para as fragilidades.


quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

"ôe ôe ôe eu sou mais indie que você!"


Ooh, dúvida cruel... Sou electro, punk, electro-punk, indie, emo, fotologger, poser, designer, bicha, biscate, cocota...? Pro Bonde das Impostoras, não seja nada! Ri horrores com as letras desse trio, composto por 2 mulheres (Vicky e Bárbara) e Cello. Já intitularam o Bonde de funk-indie, new-rave-funk-indie, mas se auto-intitulam de "picaretagem".



Lembrei-me instantaneamente do tema que a gente ia escolher pra Mostra Cultural desse ano "Minha tribo sou eu", mas acabou que falamos sobre o Poder da Propaganda mesmo =T. A história é que diante de tantos grupos comportamentais, ficamos mesmo sem saber o que é natural e o que vem de uma imposição para aceitações. Com um veneno capaz de destruir qualquer "ideologia", o Bonde das Impostoras ahazza. Eles elegem os indies verdadeiros "kings do blasè", os homens designers tornam-se bichas metidas a cults, os electros, pornô dudes de butique, as fotologgers são divas de flogão que só fazem biquinho, batem foto e usam photoshop. Xingam sapatão, hetero, Dj Malboro (na música fica Dj Malgosto), as meninas do Cansei de Ser Sexy e o Bondê do Rolê. Xingam a si próprios, negam ao mundo e morremos de rir.



Acaba que o Bonde tem uma preparação musical simples, mas o escracho de convenções a qual eles desenvolvem é o que torna o grupo especial. Não vamos aumentar, mas é o Mamonas Assassinas que temos, junto com o Bonde do Rolê!


mais sobre o Bonde da Impostora: http://www.myspace.com/bondedasimpostora
Aqui vai a letra de Fotologger Diva:
Olha pro ladinho...
Diva até o chão!
Agora faz um biquinho...
Diva do flogão!
Contraste e brilhinho
Só tem 10 minutinho
Achei uma lan house
Que tinha preço bom
Agora vou poder
Atualizar o meu flogão
Flogão ninguém conhece
E eu quero ser famosa
Agora eu vou ser
Barra doll cor-de-rosa
Cansei do meu flogão
Vou fazer aquele outro
Fotolog ponto net:
Dez comentário é muito pouco!
Olha pro ladinho...
Diva até o chão!
Agora faz um biquinho...
Diva do flogão!
Contraste e brilhinho
Só tem 10 minutinho
Fiquei acordadada
Até a uma da matina
Vou mudar o meu proxy
E dizer que sou da China
Meu próximo desejo
É ter a conta gold
Photoshop eu já tenho
Foi só fazer download
Braço para o alto
Com a câmera na mão
Com o flash na cara
Vai lá e faz carão
Olha pro ladinho...
Diva até o chão!
Agora faz um biquinho...
Diva do flogão!
Contraste e brilhinho
Só tem 10 minutinho
Tô fazendo uma lista
Da onde eu vou sair
Pra tirar muita foto
E posta por aí
Vô tirá foto com o Click
E com a Mari Moon
Anjinha de Pantufa
Ainda falta mais algum?
E o Mr. Neumann
Como eu pude esquecer?
He's 2fancy4uKanneda e
Chris BAtari, já fecho miguxa
Kat Club, ToyNico, all star é um luuuuxo Jaaaaaames,
FosfoboxBunker, Cambridge Hotel
O quê? Cândida de motel?

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Koyaanisqatsi

Inspirada no post anterior resolvi colocar aqui o trailler do documentário Koyaanisqatsi de Godfrey Reggio. O trabalho do diretor mostra-se dono de uma forte crítica à rapidez das ações imposta pelo mundo atual. A palavra koyaanisqatsi vem da língua Hopi, uma nação índia que pertencia ao nordeste do Arizona e significa "vida desequilibrada".
O documentário parece bastante experimental, não existem personagens nem enredo. No início são expostas imagens da natureza, embaladas por uma trilha sonora tranqüila, a acompanhar a leveza das imagens. Depois a música torna-se mais rápida e agressiva e imagens de destruição de ambientes naturais, circulação de pessoas, luzes da cidade são mostradas de maneira rápida e ininterrupta.
O filme faz parte da Trilogia Qatsi, que é composta pela seqüência Powaqqatsi (1988) e Nagoyaqatsi (2002).
Confesso que senti uma certa angústia e tontura após assistir esse documentário. A bomba atômica do filme parece explodir um pouco dentro da cabeça de cada um. Tenho medo da frieza e da maquinaria que já somos um pouco.
"Dinheiro é um pedaço de papel" - Arnaldo Antunes


A gente espera a novidade do dia seguinte, come, pensa em, na próxima vez, comprar algo mais gostoso, cruza os dedos pra encontrar o grande amor da sua vida no novo curso de pintura, experimenta lançamentos, percebe algumas roupas velhas e vê que precisa de novas, aguarda ansiosamente o salário no fim do mês, discute com a família, pensa e faz as pazes, ou passa um bom tempo ausente. Fica insatisfeito com o presente, mas tem certeza que o mês seguinte prometerá grandes surpresas, vive agosto para setembro, setembro para outubro... A gente critica o capitalismo, comunismo, anarquismo, budismo, catolicismo, todos os ismos, e não criamos uma própria crença. Esperamos o Carnaval, o São João, o feriado daqui a duas semanas, os preparativos para o ano novo com análises no amor, trabalho e amizade. Se há decepções, mudamos o estilo do cabelo e o círculo social.



E assim a gente vai levando. Muitas das ações vazias são formas de preencher esse espaço escuro e enigmático da vida. É necessário para nós a criação de desejos, pois, assim, a esperança em uma paz pessoal pode ter um fundamento, mesmo que seja um tanto desesperado.

Fotografia de lorpailleur_62
mais: http://www.flickr.com/photos/71347790@N00/

Respostas

Então, pessoal, dei uma lida nos comentários dos posts e espero que, de fato, vocês tenham gostado de algumas coisinhas que escrevi. Resolvi também desenvolver uma forma de debate com os textos, respondendo aos comentários.

Li a opinião do meu amigo Henrique sobre o post da campanha italiana de combate ao homossexualismo e achei interessante o que ele defendeu, no entanto não defendi em momento algum a origem do homossexualismo, se é psicológico ou genético, apenas expus a crítica de famílias católicas a uma campanha tão comovente, a qual desenvolve a idéia de que a orientação sexual não é uma eleição, pois ela existe e ponto, sendo minoria ou maioria de adeptos.
Espero mais comentários, ok?

Gostaria de agradecer a todos e, principalmente, a Henrique pelo compartilhamento de opiniões. Acho que assim as pessoas crescem.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Em seu próprio interior


Para Cris


Ela acordava sempre muito cedo, tomava uma xícara de café forte para estimular os desejos ao já desestimulante dia. Os momentos passavam seguidamente, sem muitos sobressaltos – trabalho, 40 minutos para o almoço, trabalho, telefonemas, checar e-mails, casa, dormir, acordar... blábláblá. Nos fins de semana encontro com os amigos, geralmente no happy hour da noite de sexta-feira, e o resto dos dias para dormir, reestabelecer as energias, e tudo de novo.
A outra também. A única diferença era que a rotina não era tão exigente, pois o trabalho era mais autônomo. Vendia produtos de beleza, de ervas, de vida = herbalife. Lia bons livros que inclusive possuíam algumas mensagens interessantes, mas eram os best-sellers do mês. Seus conceitos eram, de fato, universais, pois o mundo todo também os tinha; mulheres e meninos do Afeganistão, como liderar uma empresa, o segredo da vida... Eram pensamentos comuns, não por serem baseados na leitura de “livro do mês”, e sim por A outra ser uma pessoa com um presente comum, aceitável e de simples resolução. Era noiva de um gerente de restaurante e, esperava do futuro muitos filhinhos ao pé do sofá, em frente à TV, pedindo “tenção, papa e mama”.
Ela havia se separado do marido no ano passado, depois de quatro anos de relacionamento. Muitas brigas, crises e limites para Ela, que, na verdade, não aceitava tantas imposições. Era uma mulher independente e tinha um bom trabalho, apesar de passar por muitas exigências, e, por isso, não conseguiu sustentar as cobranças de um casamento fechado e sufocante. Enfim, o fim. No começo passou por algumas barras, bebeu demais, fumou demais, transou demais, se arrependeu demais e, agora, amava de menos. Menos amores, sonhos e espiritualidade. Não parecia aquela mulher que lia horóscopos, acendia incensos e tomava chás de ervas. Mudara um pouco, fumava, bebia e tossia bastante. Às vezes se olhava no espelho e via algumas rugas de experiência, mas mesmo assim se sentia muito velha, incapaz de conquistar outro alguém, e se convencia que era mais uma coroa ultrapassada, indesejável e metida a jovem, chegando a beira do ridículo. Era péssimo quando de sentia assim.
A outra também. No apartamento novo que comprou, após o casamento, colocou um grande espelho no meio da sala “para aumentar o espaço, amor”. Se sentia sufocada naquele lugar, não sabia se era o tamanho da sala ou o ciúme do marido, que, agora, não se mostrava mais tão doce e amável como no início. Não agüentava mais ficar em casa aos domingos vendo futebol com o marido pela televisão e já recebia crítica das amigas quanto ao abandono das cervejas do sábado à tarde. Já não saía muito e, talvez por isso, se sentia muito, muito velha. Não parecia aquela mulher que na juventude lia Hermann Hesse e Castañeda, não praticava mais os princípios do Reiki. Vivia para o trabalho e para uma relação desgastada, mesmo recente.
Ela sentia falta de viver outras pessoas, mais interessantes, menos boçais. Era rodeada por um círculo de competições infundadas, em prol de um objetivo nunca declarado, mas evidente. Via-se, algumas vezes, participante desse universo, mas quando se lembrava de um passado jovem transgressor, formava dentro de si uma inconformidade.
Ela queria tornar-se visível ao seu próprio mundo, a sua essência.
A outra também.
Ela lembrou-se de que o aniversário do chefe seria no fim de semana seguinte e, por isso, precisava comprar algum presente, talvez um livro, uma gravata... Melhor um livro, desses best-sellers, capaz de agradar a vários gostos.
A outra precisava comprar “Como Conquistar Os Seus Clientes”, investimento no próprio negócio também era necessário, não é?
Ela, já na livraria, caiu em si de que fazia tempos que não lia um bom livro, ou que não relia um bom livro, pois reler, além de nos trazer à tona uma história interessante, deixa-nos suscetíveis ao cheiro do passado e à idéia da existência de um fim após cada ação - os momentos passam, e não se repetem. Pegou um livro de Hermann Hesse.
A outra também. Sentia falta daquela para-sempre existência dos tempos da juventude. Já não mais suportava as mentiras para um bom convívio social em que era submetida.
Dentro de si, possuíam uma infinidade de desejos ocultos mantidos em reclusão. Pegaram, simultaneamente, O Lobo da Estepe, e, como uma inexistência de destino – lado a lado. Sentiam as vibrações das letras quando chegaram a determinado trecho, como uma inexistência de destino, e liam: “Só em seu próprio interior vive aquela outra realidade por que anseia...”.
Levantaram os olhos e se viram como projeção uma da outra. Jamais o mundo seria novamente o mesmo.
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Pintura de Marlene Dumas
"Jule-die Vrou is a disembodied portrait painting framed in extreme close-up; only the model's eyes and lips are fully rendered attributes of seduction and sexuality. The rest of the painting is obliterated by a corpulent fleshy pink, suggestive of femininity, sin, violence and womanhood. [...]"
Mais no Saatchi-Gallery.co.uk

domingo, 16 de dezembro de 2007

Fantoches, somos movidos pelo instinto

Toda vez que eu leio alguma coisa que escrevi há algum tempo me sinto a pessoa mais idiota da face da Terra, talvez porque a cada minuto que passa algo muda dentro de cada um, você vive e vê que, cada pensamento seu pode ser explorado de forma muito mais profunda. Os acontecimentos sensibilizam muitos dos nossos conceitos, aparentemente imutáveis.
Antes de postar esse texto, li-o novamente, e me senti idiota. Acho que se hoje eu fosse escrevê-lo teria um pouco menos de revolta, e um pouco mais de equilíbrio pessoal, mas resolvi não alterar, pois perderia o sentido e a lógica do que eu vivia quando escrevi esse pequeno conto. Espero comentários. (sinceros, por favor, rsrs)
“[...]Recife, musa, maldição
Cadela suja, traiçoeira
Seta certeira
Encantada cidade do cão.”

Fantoches – Francisco Espinhara

Fantoches I

Já era tarde, não o suficiente para tornar as ações humanas movidas somente a álcool e instinto, mas era o início da noitada que resultaria nesse fim. Encontravam-se alguns amigos. Com tudo combinado para a farra que aconteceria, esqueceriam as cobranças familiares durante a semana e reatariam as semelhanças ideológicas presentes entre eles e esquecidas durante o dia-a-dia cada vez mais corrido e curto.
Os bares, um dos plenos fornecedores da receita da felicidade, já estavam de portas-abertas, quase braços, para abrigar todos aqueles que se sentiam carentes de alienação, ou, simplesmente, de uma noite pra relaxar. Recife, naquela hora, era a residência dos jovens em busca de novas sensações e experiências transgressoras.

Luana foi a primeira a chegar ao local combinado, uma estreita rua de paralelepípedos na parte antiga do Recife, a qual era repleta de botecos escuros e com um desagradável cheiro de ralo, no entanto o que importavam eram as pessoas que freqüentavam o local, rockabillies em busca da cerveja barata. Em pouco tempo, Luana já não se encontrava mais sozinha, Paulo, Yanna e Jéssica, Fábio e João chegaram e todos se encontravam sentados no meio-fio discutindo o motivo da demora.

- Você tá louco, Fábio? Eu já havia dito que iríamos conseguir o copo de leite através do Mago, porque ele é mais confiável, e tu, caralho, devendo ao Recife todinho ainda se arriscou pra conseguir a merda pra gente. Querer também muita bala... Qualquer dia tu leva bala de verdade!

- Calma, mermão, eu to vivinho, tas vendo não? Me dá um abraço e vamos comemorar porque tudo deu certo e, hoje, a noite é uma criança! Traz aquela agüinha, amigo! – referindo-se ao dono do boteco, homem gordo, com uma fisionomia não muito simpática, um tanto anti-higiênico e impregnado pelo cheiro fétido do ambiente. O álcool era barato. E a rua estava lotada.

O clima era tenso, porque Fábio estava a cada dia mais viciado em pó, comprimido, injeção, drogas in general e, por isso, a compulsividade existente já bloqueava a percepção das conseqüências, e a idéia “sem dinheiro, sem drogas” não mais existia, assim, a dívida crescia e o seu rosto já não era bem visto pelos fornecedores da região. Naquela noite, todos queriam se reencontrar, esquecer as pressões da semana e se anestesiar um pouco. Fábio, então, resolveu ir em busca dos “caras”, conseguiu os elementos da felicidade, no entanto, depois, foi ameaçado, caso não soldasse a dívida... Sim, sim. Ele sabia, mas preferia fingir que esqueceu. Na verdade, o grupo de amigos, ainda colegiais, gostava das sensações provocadas pela noite recifense, mesmo com todo o cheiro, com toda a orgia, com toda a mistura, com todo o vômito, mesmo não, principalmente. Logo esqueceram do acontecimento de poucas horas atrás e já se entregavam ao ambiente, às combinações perfeitas.
Na parede esquerda do estabelecimento havia um quadro de um homem velho, com longos bigodes brancos, olhos vermelhos e emitindo uma risada enigmática, talvez sarcástica... Mas similar às risadas dos desesperados, perdidos ou loucos. Era essa imagem que Paulo e Luana observavam, elevadíssimos quanto à razão, consciência que nos conduz a agir conforme as nossas percepções de certo ou errado, e aos limites. Yanna e Jéssica se descobriam lentamente, de todas as formas... E os dois meninos programavam o local que iriam em, provavelmente, dois segundos. Casa de Fábio - o mais velho da turma, tentando o vestibular pela terceira vez - local ideal, pais ausentes, apartamento na parte superior de uma boate gay, isto é, som alto todas as sextas e sábados e a cada fim de semana um novo grupo a conhecer a “república estudantil”. 1, 2...
Não era necessário ligar o som, o DJ do térreo se encarregava, diríamos que muito bem, de regar a madrugada dessa forma. Todos sentados no chão da sala falavam assuntos ilógicos, via-se a ação desenvolvida muito mais pelo instinto, pois rugiam, gritavam como animais, como bichos em busca de satisfação. A cor era amarela. O quarto era abafado, ar não circulava, os vidros estavam pontilhados de gotículas de suor, o tapete era repleto de cinzas de cigarro. Estava tudo pronto, as misturas, os revezamentos se sucediam.
- É, cara. Até que foi bom tu ter arranjado hoje isso pra gente...

- Já? Rapaz... Isso é bom demais. Passa as pedriinhas, pedacinhos de rocha, é naturebaa!!

Tudo era motivo de risadas. Riam, riam. Era a felicidade, o oposto do que acontecia durante a semana, cobrança de estudos, exigências familiares, o inalcançável modelo de filho/aluno perfeito, enfim, desde a segunda esperava-se o fim de semana ansiosamente.

O som era alto, os gritos, os gemidos de prazer, os beijos-intensos, as formas se confundiam, as mesas viravam palcos, os pratos, lugares para o pó, a colher era a mini-panela, porque queimava na vela. O tapete era cama, não pra dormir, as drogas incitavam outras coisas. Amarelo. O quadro do louco. A rua estreita, claustrofóbica. As risadas. As intimidades veladas, agora reveladas. Virar bicha era o bicho. Antes cura para o mal dos sentimentos, agora veneno, veneno. Tudo se perdia...

Alguns dormiram, mas só no outro dia, já tarde da manhã, depois de doses, over doses: overdoses. Fábio havia trocado as faces, as linhas de divisão entre o conhecido e o enigmático. Não foi da forma imaginada no dia anterior, mas ainda sim conseqüência do vício.
O sol de Recife ainda brilhava e já havia secado o mijo e o ácido da noite anterior.

- Bárbara Buril

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

"Carnaval vem sempre pra tremer a terra!"







Multicor, multiclasses, multiraças, o carnaval consegue encantar a muitos, com uma magia secreta e cheia de purpurina que enfeitiça os poetas, cantores e, enfim, toda a classe artística que emana de suas produções muitas cores, máscaras, papangus, maracatus, passistas e, também, foliões de todo o Brasil, ansiosos para sentir, desde a quarta-de-cinzas, o calor e a cerveja gelada novamente.

O "tananananã" consegue incitar a nós, passistas-frustrados, a dar pulos, não pulos de tesoura (se é que esse passo existe), mas se serve de consolo: pulos de alegria. Vassourinhas para varrer toda a deprê do ano. Depois do Carnaval vem o peso na consciência devido aos excessos ou a inexistência de qualquer dor de cotovelo sentida antes do sábado de Zé Pereira, ou, então, antes das prévias, não é? Ai, meu pai, zelador de todas as ladeiras da cidade... rsrs


Chico Buarque está se guardando pra quando o carnaval chegar, o Parafusa toca no carnaval, todos fazendo barulho, Arnaldo Antunes fala que a máquina pode ser chamada de carnaval, Raul iria brincar o ano inteiro neste carnaval, o Pierrô, com a sua máscara negra, vai beijar-me agora, sem levar à mal, hoje é carnaval. "Olinda inteira vai descer ladeira" - Eddie, Original Olinda Style. Agora vem o Nação Zumbi com o lançamento do novo CD "Fome de tudo", muito bom por sinal. A faixa "Carnaval" resume tudo.

Já apertaram o botão da folia/Terreno de alegoria maior/E as avenidas já fervendo suadas/Que gigante tentação enfeitada/Multi-cor/ Ultra-som/Multi-cor/ Ultra-som/Carnaval vem sempre/Vai tremer a terra/Pra tremer a terra/Carnaval vem sempre/E no meio de tudo/Seu pecado lhe encontra/Solto na buraqueira Olinda-Recife/De ponte pula/Sobe e desce ladeira/Sem cair/ mestre-chão/Sem cair/ mestre-chão.



O carnaval é fonte de inspiração, é claro que é.
- Fotografias obtidas pelas lentes dos fotógrafos Breno Laprovítera e Jarbas Júnior, os quais criaram o projeto Lambe-Lambe: um estúdio de fotografia no meio do carnaval do Recife Antigo, a captar as maquiagens, cores e fantasias dos foliões.





Olhe, a cada dia eu fico passada com essas visões do passado que o catolicismo tenta impôr. Acho irônico o fato de que os próprios religiosos, tão defensores do "não matarás, não roubarás, não cobiçarás a mulher do próximo... etc, etc," são as pessoas que mais conseguem atingir o espaço individual e a liberdade de cada ser, com as orações para a purificação da alma de todos os pecados, amém.


Estava navegando pelos sites e, de repente, caí no ACI digital - O que todo católico necessita saber (www.acidigital.com/noticia.php?id=11740), encontrei, então, nessa notícia, uma super crítica a uma campanha italiana patrocinada pelo Ministério de Igualdade de Oportunidades da Região Toscana.


As organizações familiares qualificaram a propaganda de "horrorosa e ofensiva para qualquer ser humano". E o Papa Bento XVI é mais uma marionete.

Fantoches


Pra começar a escrever esse blog, ohh, será essa mais uma tentativa frustrada? Enfim... Li um poema de Francisco Espinhara, poeta recifense que participou do cenário da arte marginal dos anos 80. Foi um dos coordenadores do Movimento de Escritores Independentes¹. Achei interessante o paralelo traçado entre nós, pessoas-máquinas nesses "Tempos Modernos" e os fantoches, controlados por um sistema maior. Enquanto isso, no Recife, cidadão do cão, residem pessoas com as mais diferentes personalidades, desejos e estados mentais.
Fantoches

Os fantoches da rua Sete
Seguem cegos na procissão.
A puta diurna da Palma
Traz uma venérea na alma
E uma cova diária na mão.
Da Ponte Velha a secular ferrugem
Reticente ao trajeto branco da nuvem
Come o estrado, o arco, o vergão.
Os poetas esquecidos no beco
Transam sangue a trago seco
Dormem como trapos sobre chão.
Recife, musa, maldição
Cadela suja, traiçoeira
Seta certeira
Encantada cidade do cão.

Francisco Espinhara


¹. para saber mais: http://www.interpoetica.com/francisco_espinhara_gm.htm
Fotografia por Rodrigo Sotero. Mais: http://www.flickr.com.br/rsotero